segunda-feira, 30 de julho de 2012

[o que o barro quer]

o barro
toma a forma
que você quiser

você nem sabe
estar fazendo apenas
o que o barro quer


[Leminski]

domingo, 15 de julho de 2012

"Dentro de uma sociedade, assim como os discursos, as memórias são controladas e negociadas entre diferentes grupos e diferentes sistemas de poder. Ainda que não possam ser confundidas com a "verdade", as memórias têm valor social de "verdade" e podem ser difundidas e reproduzidas como se fossem "a verdade" 

[Teun A. van Dijk]

sábado, 14 de julho de 2012

Caravaggio - "Davi com a cabeça de Golias"
Um gigante monstruoso, de faces abomináveis, herói dos filisteus e maldoso em sua essência desumana. 
Golias, o grande monstro de quase três metros, com faces grotescas e risada aterrorizante.
Morto, por uma pedrada simples e precisa, por quem estava praticamente desarmado, por alguém que julgava-se munido apenas de .
Não obstante seu escudo forte e sua lança afiada, Golias sucumbe, e sua cabeça é levada à Jerusalém.

Como compreender a intenção de Caravaggio, ao representar sua própria face na imagem de Golias, o monstruoso gigante? 

A própria face, numa expressão perversamente barroca, distorcida e enfatizada pelo jogo de luz e sombra, chiaroscuro, hipnotizante, dramaticamente representada em uma expressão de perversidade e rendição. Ele, ele próprio, em um auto-retrato de seu próprio espírito. Expondo-se em sua mais clara e límpida representação. 

Uma existência conflituosa, emaranhada em sentimentos confusos e intranscritíveis. Possivelmente, apenas representáveis em uma arte essencialmente desfigurante, conceitualmente torta, barroca. Uma arte encomendada para emoldurar as mais sacramentadas catedrais. Elaborada, no entanto, através de um realismo brutal e pouco celestial.

Caravaggio utilizava-se de rostos comuns, encontrados nas praças, nas ruas, nos prostíbulos, para representar seus anjos e madonas. Maria, mãe de Cristo, tinha a face de qualquer prostituta. Os anjos, de qualquer pequeno mendigo. E ele, ele próprio, a face de um monstro.

A complexa impureza do barroco, seu jogo de claro-escuro, sua deformidade e pretenso realismo. A representação mais clara de si mesmo, de seu espírito e sua essência, numa imagem assombrada de quem conseguiu finalmente definir-se.
Do seu próprio modo.




terça-feira, 3 de julho de 2012

Toulouse-Lautrec

E, de repente, mostra-se como um todo honesto
Em sua bruta e rasgante anti-sociabilidade
Vestindo-se, portando-se, gargalhando(-se)
Num grito forte
Contra tudo
E contra si mesma.
Como se fosse esta a única saída
Que o sentimento encontra para se tornar visível.
[...]
Digo adeus à ilusão
Mas não ao mundo. Mas não à vida,
meu reduto e meu reino.
Do salário injusto,
da punição injusta,
da humilhação, da tortura,
do terror,
retiramos algo e com ele construímos
um artefato, um poema,
uma bandeira.

[Ferreira Gullar, Agosto 1964]